A avaliação ortodôntica na infância é um passo essencial para garantir o desenvolvimento saudável e harmônico do sorriso e das estruturas faciais. Mais do que uma questão estética, o início do acompanhamento ortodôntico na idade certa pode prevenir desequilíbrios funcionais e reduzir a necessidade de intervenções complexas no futuro. Com os avanços da ciência e a compreensão das fases de formação da dentição, o ortodontista tem hoje as ferramentas necessárias para identificar o momento ideal de cada tratamento, desde a observação das primeiras mordidas cruzadas até a adoção de tecnologias modernas como alinhadores e expansores assistidos por mini-implantes. Nesta entrevista, a Dra. Soo Young Kim Weffort, presidente da Sociedade Paulista de Ortodontia (SPO), além de especialista, mestre e doutora em Ortodontia, esclarece as principais dúvidas sobre o tema, reforçando a importância do diagnóstico precoce e da atuação integrada entre ortodontistas, clínicos gerais e odontopediatras.
Qual a melhor idade para pensar em iniciar tratamentos ortodônticos?
Dra. Soo Young Kim Weffort – No passado, pouco se sabia sobre as melhores fases para o tratamento ortodôntico. Muitos tratamentos iniciavam na fase de troca dos incisivos (6-7 anos) e terminavam na fase de dentadura permanente (11-12 anos). Era muito comum ouvir relatos de tratamentos que duraram 5, 6 ou até 7 anos.
O entendimento das fases da biogênese das dentições, ou seja, das fases de formação da dentadura decídua, dentição mista e dentadura permanente, trouxe muito esclarecimento e possibilitou ao ortodontista estabelecer o melhor momento para cada caso.
O diagnóstico ortodôntico é realizado com base nas características apresentadas pelo paciente e, no caso da criança (paciente em crescimento), deve ser avaliado o padrão esquelético facial, identificando tendências do crescimento facial.
A primeira avaliação ortodôntica deve ser realizada na fase de dentadura decídua. Entretanto, não significa que o tratamento sempre será iniciado nessa idade. Muitas vezes, apenas o acompanhamento periódico é suficiente até o momento ideal de intervenção.
Nesta fase, as mordidas cruzadas devem ser observadas: discrepância transversal (mordida cruzada posterior) e anteroposterior (mordida cruzada anterior). Essas duas situações devem ser corrigidas, se possível, ainda na dentadura decídua, pois impedem que o crescimento crânio-facial se desenvolva corretamente.
Quais são os tratamentos realizados na Ortodontia?
Os tratamentos na Ortodontia abrangem movimentações dentárias e remodelação óssea, equilibrando estética e função. Podem melhorar condições adversas das áreas de vias aéreas desde a infância até a fase adulta.
Atualmente, com o advento da tecnologia digital, têm sido fundamentais as avaliações tomográficas para decisões de tratamentos cirúrgicos e multidisciplinares, como nas áreas de fonoaudiologia, otorrinolaringologia, implantes e outras.
Tem alguma idade que é mais indicada para iniciar esses tratamentos?
Na primeira fase da troca dos dentes anteriores, por volta dos 6-7 anos, deve-se observar o alinhamento dos incisivos superiores e inferiores. Nesta fase, os incisivos devem estar alinhados, estabelecendo a dentição mista. Também deve ser observada a presença dos primeiros molares permanentes.
Caso seja identificada a falta de espaço para a irrupção dos incisivos laterais superiores ou inferiores, a intervenção ortodôntica é recomendada antes da fase de troca dos caninos e pré-molares.
Portanto, deve ser sempre avaliada a biogênese correta da dentição, averiguando se esta está ocorrendo adequadamente, com os dentes alinhados para cada fase da formação.
Geralmente, quais são as causas de problemas com más oclusões?
A etiologia das más oclusões inclui origem genético-hereditária e causas epigenéticas. O padrão esquelético-facial é determinado geneticamente, mas pode ser influenciado por hábitos bucais, como chupeta, sucção digital, interposição de língua ou lábios, ou por alterações de funções, como a respiração bucal crônica. Desequilíbrios musculares posturais, traumas e perda precoce de dentes decíduos também fazem parte dos fatores etiológicos das más oclusões.
Quais são as opções disponíveis para tratamentos ortodônticos e quais são suas indicações?
Muitos são os recursos atuais no tratamento ortodôntico:
• Aparelhos ortodônticos com braquetes fixos metálicos – eficientes, de menor custo e aparência menos estética.
• Aparelhos ortodônticos com braquetes estéticos (de safira ou cerâmica) – mesma mecânica, mas com aparência mais discreta.
Ambos podem ser do tipo braquetes autoligados, mais eficientes na mecânica.
• Aparelhos funcionais e ortopédicos removíveis – estimulam ou restringem o crescimento ósseo em pacientes em fase de desenvolvimento.
• Alinhadores transparentes – alternativa estética e confortável, indicada para adolescentes e adultos, inclusive idosos. Eficazes para a maioria dos casos.
• Aparelhos removíveis – usados principalmente como contenção.
• Contenções ortodônticas – utilizadas após o tratamento ativo, para manter o resultado obtido.
• Acessórios auxiliares – mini-implantes ortodônticos utilizados para ancoragem esquelética.
Deve-se estar atento às mordidas cruzadas posteriores, que podem ser corrigidas facilmente na fase de dentadura decídua e dentição mista. No adulto jovem, atualmente temos o recurso do MARPE (expansão rápida da maxila assistida por mini-implante), ótimo recurso que tem minimizado as indicações cirúrgicas para expansão da maxila, único recurso para adultos com mordida cruzada.
A falta de crescimento do terço médio facial também pode ser corrigida com aparelho de tração reversa nas fases de dentadura decídua e mista, evitando cirurgias faciais (ortognáticas) no futuro.
A indicação do clínico geral e do odontopediatra na identificação do problema oclusal é fundamental para que o tratamento seja realizado na fase correta, sem que se antecipe sem benefícios ou se atrase, comprometendo as possibilidades de tratamento.